«No Egipto, as bibliotecas eram chamadas ''Tesouro dos remédios da alma''. De facto é nelas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras.»

Jacques Bossuet





quarta-feira, 26 de junho de 2024

Cerromaior - Manuel da Fonseca

Nova entrada na Biblioteca JMO

Cerromaior
Manuel da Fonseca
Capa de Manuel Ribeiro de Pavia
(1ª Edição - 1943 - PUBLICAÇÃO: Lisboa : Edirorial Inquérito.)
 Editor A Bela e o Monstro
Coleção Biblioteca da censura

Nota: " No prefácio à edição de 1982, o autor explica as condições particulares que rodearam a primeira edição desta obra basilar do neorrealismo português: submetido a uma censura prévia, o original da obra foi largamente truncado, correspondendo a edição de 1982 a uma tentativa de reconstituição de um manuscrito, entretanto, perdido. Ainda no prefácio, recorda com amargura a polémica receção com o que livro foi acolhido, sobretudo pela crítica, que se digladiou sobre a qualidade literária do romance. Insensível ao carácter de símbolo que os espaços e algumas personagens assumem no romance, a crítica reagiu contra uma escrita romanesca que, de acordo com coordenadas estéticas neorrealistas, rompia com cânones narrativos tradicionais, pela ausência de uma intriga que centralizasse os feixos narrativos, pela despretensão da escrita, límpida e simples, pela realidade social e regional que trazia para a literatura. Cerromaior, nome imaginário de uma vila alentejana, sugere um espaço fechado, uma atmosfera sufocante e rude, onde se desenrolaram em simultâneo as tragédias de uma povoação oprimida pela miséria e pela tirania dos senhores da Casa Vã. O espaço da prisão, com que se inicia e encerra o romance, depois de uma longa retrospetiva que descreveu o itinerário iniciático do crescimento de Adriano, numa aprendizagem da vida, das injustiças, da hipocrisia, da mesquinhez humana, e numa progressiva revolta contra a sociedade, simboliza outras prisões: a prisão das convenções sociais que impõem o recalcamento sexual de algumas personagens, nomeadamente de Adriano ou Lena; a prisão das recordações, de frases e imagens que a cada passo assolam as personagens; a prisão maior da fome e da miséria que tolhe a dignidade de ceifeiros e desempregados. No entanto, o romance vai descrevendo também um percurso de libertação, que, com Doninha, culmina na loucura, mas que, em Adriano, vai da realização sexual até à capacidade de assumir as suas opções e à violência contra os representantes da repressão. O enclausuramento final de Adriano deixa, por isso, em aberto uma nota positiva: "Puro e sem pecados, o coração batia-lhe. Ergueu-se. Ia caminhar. Visíveis, à sua volta, os pobres que tapavam o portão do quintal, Doninha, Zé da Água, Tóino Revel, Bia Rosa, Inácia, Antoninha, Maltês e os ceifeiros da Fonte Velha seguiam-no. Ao lado, passo a passo, a mãe ia também - nem ele sabia para onde, mas tinha a certeza de que era para uma planície de fartura e paz."


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